The Handmaid’s Tale é uma nova série da Hulu baseada no livro com o mesmo nome de Margaret Atwood, que já tinha sido adaptado para o cinema em 1990. 

A série segue em muitas coisas o filme, incluindo alguns diálogos ipsis verbis, no entanto não deixa de ser algo a ver.


A originalidade da série torna-se presente, entre outros detalhes, na transposição da história para o nosso presente, tal como já tinha sido feito com Romeu + Julieta em 1996.

A ajudar temos ainda a apresentação de momentos no passado das personagens principais em flashbacks que fazem lembrar os que se viram no recente filme Arrival em termos visuais. A fotografia da série no seu todo é, aliás, deslumbrante e merece um prémio, na minha opinião.


Alguns pormenores de indumentária foram modificados, o que sublinhou ainda mais o espectáculo visual que nos assombra a tela, dos quais destaco as abas laterais brancas que todas as aias usam como parte do seu uniforme, chamadas de wings.


Poderia entrar aqui numa análise detalhada da simbologia das mesmas, assim como das cores das indumentárias que se vêm ao longo dos episódios, no entanto penso que isso se percebe bem com o contexto.

Sabendo que vermelho é uma cor associada ao sangue e fertilidade, verde à esperança, castanho aos Nazis e cinzento à monotonia consegue também perceber-se os papéis das pessoas que as envergam mesmo sem saber o resto da história.



A história em si é uma visão sobre um mundo onde as mulheres não só não podem votar, como não podem sequer ler, ter propriedade ou sequer opinião sua. Um mundo onde o universo duma mulher fértil é o de procriar, servir e nada mais.

É um voltar aos valores ditos tradicionais num estado totalitário teocrático que se instalou aos poucos com a retirada de cada vez mais liberdades. Primeiro civis, com o terrorismo como prova de força maior, de que “isto é necessário para a vossa segurança” e depois somente do género feminino, estando já as bases para uma mudança de sistema instaladas.



Mais tarde, com as vicissitudes duma guerra civil e de uma luta contra a resistência até as mulheres que aplaudiram esta mudança para “os valores tradicionais americanos” viram as suas liberdades reduzidas, coisa que nunca pensaram acontecer devido ao seu status social.

Este escalar de retirada de liberdades associado às razões apresentadas para a mesma lembra-me um poema de Brecht, que acho que consegue resumir bem uma das críticas que esta série faz: 



"Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei

Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.”

 



Concluindo, Handmaid’s Tale é uma excelente adaptação do livro de Atwood transposta para os dias de hoje. 

Uma distopia com contornos mais suaves do que os vistos em 1984 e, por isso, mais assustadora. A sua capacidade de terror reside na sua proximidade sócio-temporal.

Porque pode acontecer se não nos importarmos o suficiente.



Eloísa V.,
blogger em: Casa da Pirralha